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Mar.Manhã

 

16 - 11- 1909

SUAVEMENTE grande avança,
Cheia de sol a onda do mar;
Pausadamente se balança,
E desce como a descansar.

Tão lenta e longa que parece
De uma criança de Titã
O glauco seio que adormece,
Arfando à brisa da manhã.

Parece ser um ente apenas
Este correr da onda do mar,
Como  uma cobra que em serenas
Dobras se alongue a colear.

Unido e vasto e interminável
No são sossego azul do sol,
Arfa com um mover-se estável
O oceano ébrio de arrebol.

E a minha sensação é nula,
Quer de prazer, quer de pesar ...
Ébria de alheia a mim ondula
Na onda lúcida do mar.


Fernando Pessoa
Obra Poética - Volume Único - página 105
Editora Nova Aguilar
1990

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