Pular para o conteúdo principal

Janela - Adélia Prado



Janela, palavra linda.
Janela é o bater das asas da borboleta amarela.
Abre pra fora as duas folhas de madeira à-toa pintada,
janela jeca, de azul.
Eu pulo você pra dentro e pra fora, monto a cavalo em você,
meu pé esbarra no chão. Janela sobre o mundo aberta, por onde vi
o casamento da Anita esperando neném, a mãe
do Pedro Cisterna urinando na chuva, por onde vi
meu bem chegar de bicicleta e dizer a meu pai:
minhas intenções com sua filha são as melhores possíveis.
Ô janela com tramela, brincadeira de ladrão,
claraboia na minha alma,
olho no meu coração.

Adélia Prado

Comentários

Postar um comentário

Deixe seu comentário:

Postagens mais visitadas deste blog

Os Colegas - Lygia Bojunga

Para o mês das crianças, "Livro Bacana"* Quando estava na frente da estante, procurando qual livro poderia indicar para este mês das crianças, não tive a menor dúvida de qual deles escolher: Os Colegas , de Lygia Bojunga.  O primeiro livro dessa escritora gaúcha, ganhador de vários prêmios, dentre eles o prêmio Jabuti, é um dos meus livros favoritos da vida. Motivo? Eu só o conheci na fase adulta e ele tocou profundamente a criança que existe em mim.  Essa obra-prima da literatura infantojuvenil brasileira tem como pano de fundo a nossa tradicional e popular festa de Carnaval e o mundo circense. Além disso, as personagens principais são animais, o que dá o tom de fábula para história. Assim, somos apresentados aos cachorrinhos Virinha, Latinha e Flor-de-lis; ao coelho Cara-de-pau e ao urso Voz de Cristal.  Por intermédio da sua descrição física e psicológica, as personagens vão sendo construídas por Bojunga, dentro do universo ficcional. No decorrer da narrativa, o leitor pod

"L'enfer, c'est les autres": um convite à leitura da representação do feminino no romance teatral sartreano em tempos pandêmicos [1]

Considerando que a literatura reflete os valores do tempo histórico em que se insere, entendemos que a expressão do teatro traz para o palco a fruição do discurso literário em sua profunda potência. Sob tal perspectiva, temos manifestações desse viés artístico na contemporaneidade dignos de nota. O beijo no asfalto , por exemplo, peça teatral de Nelson Rodrigues, teve mais uma adaptação recente ao cinema (2017), trazendo os bastidores do filme que encenam a peça, numa discussão entre várias vozes, mesmo as mais caladas, visto que o enredo transcorre às vésperas da ditatura militar do Brasil (1960). A temática de gênero, o controle ideológico por parte dos meios de comunicação e a condição humana como questionamentos do viver e do existir tornaram este trabalho mais que uma mera adaptação. Da mesma forma, os elementos há pouco elencados fazem do teatro de Sartre uma profunda fonte de inspiração para as questões relativas ao existencialismo tanto no final do século XX, quanto para a ref

O relógio das estrelas: Suzana Amaral e Clarice Lispector - Cassiana Lima Cardoso

Dedico aos amigos do cineclube Raul Lopes, especialmente à Lília Olmedo Monteiro, nossa anfitriã.   No livro “A Hora da estrela” (1977), de Clarice Lispector, a personagem Macabéa apaixona-se pela palavra efeméride , termo que Seu Raimundo, também um amante discreto das palavras difíceis, a manda copiar “com sua letra linda”.  Fortuna e infortúnio têm suas nuances. Não por acaso, Eduardo Portella, autor do prefácio do livro, intitulado “O grito do silêncio”, costumava dizer: “o acaso existe”. E previsto ou imprevisto, (não tem a pretensão esse texto, de mais ou menos oitocentos caracteres, quitar a discussão filosófica acerca da questão do destino), morre Suzana Amaral, autora da obra-prima, que é a versão cinematográfica da história de nossa Maca, justamente no ano do centenário de Clarice Lispector. O filme é de 1985, lançado em 1986. Decerto, ambas, escritora e cineasta, habitarão a mesma constelação em nossa memória. Duas mulheres notáveis, que realizaram obras de arte da mesma est